Decidi entrar na floresta.
O primeiro passo para além da clareira foi suficiente para o mundo mudar. A luz parecia morrer alguns metros depois, engolida pelo emaranhado de galhos e folhas. O chão era macio demais sob meus pés, coberto por camadas antigas de folhas úmidas que abafavam qualquer som que eu fizesse.
Caminhei devagar, tentando memorizar o caminho, contando passos, procurando marcas nas árvores. A floresta, no entanto, não colaborava. Tudo parecia igual demais, como se o espaço estivesse se reorganizando atrás de mim.
Foi então que senti.
Não ouvi nada. Não vi nada. Ainda assim, tinha a certeza incômoda de que não estava sozinha. Algo me acompanhava à distância, mantendo-se fora do meu campo de visão, atento demais para ser apenas imaginação. A sensação era constante, um peso entre as omoplatas, como se olhos invisíveis me empurrassem para frente.
Acelerei o passo.
Galhos começaram a estalar ao longe. Não vinham sempre do mesmo lugar. Às vezes à esquerda, às vezes atrás de mim. Nunca perto o suficiente para confirmar, nunca longe o suficiente para aliviar. Meu coração martelava no peito, e o ar parecia mais difícil de puxar.
Comecei a correr.
O chão traiu meus pés. Tropecei em uma raiz exposta e caí com força, sentindo o impacto subir pelas pernas. Quando me levantei, desorientada, percebi que não reconhecia mais o caminho. As árvores eram outras. O silêncio era outro. Eu havia perdido a trilha.
Foi quando vi a cabana.
Ela surgia entre as árvores como algo esquecido pelo tempo: uma construção de madeira escura, inclinada levemente para o lado, com dois andares e janelas vazias como órbitas ocas. O telhado estava parcialmente cedido, e a porta pendia torta nas dobradiças enferrujadas.
Esperei alguns segundos antes de me aproximar, tentando ouvir qualquer sinal de perseguição. Nada. Nenhum estalo, nenhum movimento. Pela primeira vez desde que entrei na floresta, senti que talvez tivesse despistado o que quer que estivesse me seguindo.
Entrei.
O interior da cabana cheirava a madeira podre e poeira antiga. Havia poucos móveis: uma mesa de centro com uma perna quebrada, duas cadeiras inutilizáveis encostadas na parede, um sofá rasgado cuja espuma escapava como vísceras secas. Tudo indicava abandono há muitos anos.
No canto do cômodo, uma escada estreita subia para o segundo andar. Alguns degraus estavam rachados, rangendo sob o menor toque, mas ainda pareciam suportar peso.
Sobre a mesa de centro, espalhadas de forma descuidada, havia folhas soltas cobertas por símbolos estranhos. Traços circulares, marcas repetidas, desenhos que pareciam feitos às pressas, como se quem os tivesse desenhado estivesse mais preocupado em registrar do que em entender. Alguns símbolos se repetiam, outros pareciam propositalmente incompletos.
Ao lado das folhas, repousava um caderno de capa gasta. Um diário.
O silêncio da cabana não era confortável, mas era melhor do que o da floresta. Ainda assim, eu sentia que aquele não era um lugar neutro. Algo ali havia sido interrompido, abandonado às pressas, como se ninguém tivesse tido tempo de encerrar nada direito.
Eu precisava decidir rápido.
O que eu faço?